quinta-feira, 19 de junho de 2008

Seus filhos não aprendem nada no computador?

Por Paulo Blikstein*

"A cena é comum: filhos trancados no quarto na internet e, do lado de fora, pais desorientados, indecisos entre regras rígidas ou rendição total às novas tecnologias. Afinal de contas, a internet é essa nova e fantástica tecnologia que aproxima as pessoas e promove o aprendizado, ou uma demoníaca rede repleta de pornografia, violência e milhares de oportunidades de uso improdutivo do tempo?

As palavras de Marshall McLuhan, um dos mais importantes teóricos da comunicação do século XX, iluminam esse debate: "nós criamos tecnologias, e as tecnologias nos recriam". Em outras palavras, seres humanos e artefatos tecnológicos vivem em simbiose, ou seja, o avanço tecnológico e a evolução humana são conectados e simultâneos - pense em como a vida desmorona em apenas algumas horas quando falta energia elétrica. As tecnologias são não externas à vida, aliás, como diria Pierre Lévy, é o uso das tecnologias que nos faz terrivelmente humanos.

Para os jovens, portanto, não há distinção entre o mundo da internet e o mundo físico. Para eles, internet e computador nem são "tecnologias", mas artefatos absolutamente normais e cotidianos. Suas relações virtuais são tão reais quanto aquelas de carne-e-osso, o que pode até parecer absurdo para muitos adultos. Portanto, quando proibimos que a criança use a internet (que é, para nós, algo 'separado' do mundo), na cabeça dela estamos apenas proibindo-a de viver.

O fundamental é estruturar uma vida cognitiva e emocionalmente saudável que inclua as novas tecnologias de forma produtiva. Herbert Simon, Nobel de Economia em 1978, dizia que na era do computador, "informação não é o recurso escasso, o que é precioso é o tempo e a atenção humana". Portanto, hoje o foco não é mais na escassez de informação, mas na articulação da atenção e na interpretação de idéias - o que, infelizmente, nossas escolas ainda não sabem como ensinar. Ao contrário, o que seus filhos aprendem na escola é apenas pesquisar na internet, como se pesquisa em uma biblioteca. Claro, abundância de informação não gera capacidade analítica por si só.

E os grandes teóricos do uso das novas tecnologias na educação, como Seymour Papert, dizem que a tecnologia deve ser usada sobretudo para converter consumidores de informação em produtores de conhecimento, leitores em escritores, espectadores em cineastas. Diante desse novo e difícil cenário, o que os pais devem fazer? A seguir listamos seis idéias que podem ajudar.

1) Fique atento aos primeiros meses de uso da internet e do computador. Desde o começo, tente equilibrar atividades de relacionamento online, entretenimento e educação. Escolha bem os softwares e sites, evite produtos que tentam 'adestrar' a criança, ou jogos educativos simplistas, do tipo 'tiro ao alvo com matemática'. Desconfie de produtos que não tem uma equipe de psicólogos ou educadores entre seus projetistas. Dedique tempo para destacar conteúdos positivos, em vez apenas se preocupar com bloquear o que não é apropriado.

2) Faça do computador um objeto social, não individual. Coloque o computador "das crianças" na sala da casa, e não no quarto delas. Se forem laptops, crie um espaço onde todos trabalhem juntos.

3) Participe do mundo 'online' de seus filhos. Muitos pais não hesitariam em assistir a apresentação de teatro dos filhos, mas nunca teriam paciência para assistir eles "zerando" o Super Mario, arranjando uma namorada no "The Sims" ou visitando um novo site que eles descobriram. Participe desse mundo, acompanhe o que eles fazem, valorize suas conquistas "virtuais".

4) Procure direcionar as crianças para atividades de geração dos conteúdos e produtos, em vez de apenas consumi-los. Por exemplo, estimule-os a criar seus próprios sites e blogs, ensine-os fotografia digital, coloque em um curso de robótica (ou compre/monte um kit de robótica educativa, como o Lego Mindstorms, Vex, ou a Gogo Board).

5) Hoje há uma infinidade de linguagens de programação de computadores para crianças, fáceis de aprender e muito mais interessantes do ponto de vista educacional do que sites ou jogos, como NetLogo (ccl.northwestern.edu/netlogo), Scratch (scratch.mit.edu), AgentSheets (http://www.agentsheets.com), Squeak (http://www.squeakland.org) e Microworlds Logo (http://www.microworlds.com). Muitas dessas linguagens usam blocos ou ícones, fazendo a programação acessível por crianças mesmo antes dos 10 anos.

6) Crie projetos em conjunto, de preferência integrando a família e a comunidade. Por exemplo, proponha a criação de um site sobre a história da família com entrevistas e fotografias; ou um sistema robotizado de coleta de lixo para o seu bairro. Faça parte dos projetos e delegue a elas a coordenação. Por exemplo, você pode ser o fotógrafo, o narrador ou o motorista.

Muitos dizem que essa geração é "burra", pois, supostamente pendurada no Orkut, não sabe nomes de presidentes ou datas históricas. O mesmo foi dito da televisão há trinta anos. Claro, largadas à própria sorte, as crianças investirão um tempo enorme em sites de relacionamento (aliás, como faziam antes, na rua, na escola, no clube) e possivelmente lerão menos livros, estudarão menos. Em vez de achar que a culpa é das crianças ou dos computadores, talvez o problema seja o que os adultos colocam - ou deixam de colocar - dentro deles."


* Paulo Blikstein é especialista em tecnologias para Educação; doutorando em educação pela Northwestern University (Chicago) e mestre pelo Media Lab, do Massachusetts Institute of Technology (MIT). É engenheiro e mestre em engenharia pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.



(Envolverde/Assessoria)

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